Cabe
à convenção do condomínio especificar as regras internas", afirma o
advogado Márcio Rachkorsky, presidente da Associação de Síndicos de
Condomínios Comerciais e Residenciais do Estado de São Paulo
(Assossíndicos) e apresentador do programa "Condomínio Legal", da rádio
CBN.
Apesar de a delegação de poderes aos
condôminos ter tornado todo o processo mais democrático, não é de se
esperar que uma multidão de pessoas cujo único vínculo comum é o fato de
terem escolhido o mesmo lugar para morar cheguem rapidamente a um
consenso sobre temas considerados polêmicos até mesmo para juristas.
Para resolver esse tipo de impasse, os especialistas aconselham a
criação de regras e sanções bastante detalhadas para nortear a
convivência. Leia abaixo as dicas de dois advogados especializados em
direito condominial para evitar os pomos de discórdia mais rotineiros:
Cachorro: Campeões
de resmungos de vizinhos, os animais de estimação até pouco tempo eram
proibidos por boa parte dos condomínios. Mas os tempos mudaram. Em
estados como Rio de Janeiro, esse tipo de regra já se tornou ilegal. Nas
outras regiões, a jurisprudência garante ganho de causa para quem entra
com ação pedindo autorização para ter um bichinho dentro do
apartamento. A dica, então, é ser extremamente meticuloso na criação do
regulamento interno. "Tem que abranger todos os detalhes - se pode
entrar garagem ou pela porta de pedestres ou em que situações o animal
deve usar focinheira, por exemplo", diz Rachkorsky. "Isso já é meio
caminho andado para evitar confusão". Em situações que extrapolam o
limite do tolerável, como quando o cachorro rotineiramente é deixado
sozinho e não para de latir, devem ser tomados os procedimentos padrões
para quebra de regulamento. Há casos, afirma Marcelo Borges, da
Associação Brasileira das Administradoras de Imóveis (ABADI), que podem
parar na Justiça. "O animal pode até ser expulso do prédio", diz.
Crianças: O
primeiro aspecto para prevenir problemas com as crianças do condomínio é
criar áreas comuns de lazer. "Elas aprontam quando não têm nada para
fazer", diz Rachkorsky. Se o prédio não possui espaço disponível, o
jeito é usar a criatividade. Salas ociosas podem ser transformadas em
brinquedotecas, salão de jogos e até equipadas com home theater para
exibição de filmes. Outra dica do presidente da Assossindicos é eleger
um síndico mirim. "Ele terá a responsabilidade de levar as demandas das
crianças para o síndico principal, também vai fiscalizar os amiguinhos",
afirma.
Calote: Desde
2003, quando entrou em vigor o novo Código Civil, os síndicos perderam
uma importante ferramenta para o combate à inadimplência. Até então, o
teto das multas para quem não pagava as taxas condominiais em dia era de
até 20% do valor do condomínio. Essa taxa, agora, caiu para 2%. "Isso
criou uma categoria de inadimplentes volantes, que atrasam alguns meses,
mas não sempre. Como a multa é menor do que ficar com outros pagamentos
em atraso, o condomínio acaba sendo a última preocupação das pessoas",
afirma Rachkorsky. No entanto, a administração dos prédios ainda tem
como recurso protestar as contas atrasadas em cartório. Se o condômino
não pagar no prazo estipulado, terá o nome incluído em listas sujas dos
serviços de análise de crédito, como o SCPC e a Serasa.
Cano: Fora
do alcance da visão de boa parte dos moradores, os problemas de
encanamento podem ser protagonistas das piores dores de cabeça de
qualquer vida em condomínio. "A grande dica resolver essas questões com
agilidade porque fica barato para todo mundo", diz Rachkorsky. O
primeiro ponto, portanto, é ter consciência sobre as responsabilidades
de cada um. Assim, quando a assunto é encanamento, os encargos se
separam em duas esferas. Se o problema for na ramificação geral do
prédio, a missão de reparar os danos recai sobre o condomínio. "O Código
Civil até determina que se o síndico for omisso na correção de
determinados vazamentos e isso ficar provado, o morador pode solucionar o
problema e, depois, cobrar do condomínio", diz Borges. Dentro do
imóvel, a responsabilidade é do condômino. "De acordo com a Lei de
Responsabilidade Civil, ninguém pode provocar dano ao outro. Se há
vazamento em meu apartamento, é meu dever reparar", afirma o advogado da
ABADI.
Carro: A
maneira como cada morador enxerga o ato de conduzir um veículo pode ser
outro pivô de atritos homéricos no condomínio. Criar regras claras e
ser criativo na hora de construir a garagem é essencial para
preveni-los. A começar pela segurança. "O condomínio precisa definir se
lhe é interessante ser guardião da garagem", diz Borges. Estabelecido
isso, o próximo passo é determinar a velocidade máxima para os veículos
e, em casos de escassez de espaço, adaptar o estacionamento do prédio.
Para isso, há uma série de soluções. "Dá para instalar vallets, guincho
hidráulico e, até, contratar manobristas", sugere Rachkorsky. Ele também
diz que o tamanho das vagas de garagem costuma gerar atritos entre
condôminos. Em geral, falta espaço para a maioria dos condôminos
estacionar veículos de grande porte, como picapes ou SUVs - cada vez
mais comuns no Brasil. Com pouco espaço, cresce o risco de que haja
avarias na lataria. No longo prazo, a solução passa pelo aumento do
tamanho das vagas nos prédios que serão futuramente construídos.
Acessibilidade: De
uns tempos pra cá, outros assuntos passaram a fazer parte da pauta das
assembleias dos condomínios. Um deles é a promoção da acessibilidade dos
edifícios para deficientes físicos. De acordo com o decreto federal
5.296, de 2004, todos os prédios, sejam privados ou públicos, devem ser
adaptados para que pessoas portadoras de alguma deficiência física
possuam livre acesso ao edifício. "Os condomínios tinham até 2008 para
fazer essas alterações", diz Mara Gabrilli, ex-secretária da Pessoa com
Deficiência da cidade de São Paulo. No entanto, na prática, a lei não é
respeitada pela maioria dos condomínios. Até porque, de acordo com
Borges, da ABADI, alguns edifícios não possuem condições arquitetônicas
para tais adaptações. Tendo em vista isso, na capital paulista foi
criada uma lei municipal que faculta a exigência das modificações para
prédios construídos antes de 1992. "Um condomínio habitacional não pode
privar uma pessoa da livre circulação", diz Mara. Assim, de acordo com
ela, toda entrada dos prédios deveria ter soluções como rampas ou
elevadores para permitir a passagem de condôminos ou visitantes
portadores de alguma deficiência física, além de elevadores internos que
respeitem os padrões determinados pela ABNT.
Barulho: Os
decibéis emitidos pelos moradores são os principais pivôs de discussões
e caras feias nos condomínios. É o salto da vizinha do andar de cima
que impede que alguém consiga tirar um cochilo, são as crianças que não
param de pular ou o gosto musical duvidoso do companheiro de andar Para
esses e outros problemas ligados ao barulho excessivo, o condomínio deve
sempre criar um bom regulamento interno. Determinar os períodos para o
silêncio, o limite máximo de decibéis e as punições para quem infringir
as regras são cruciais para resolver este impasse. Em alguns estados,
existem leis que determinam qual é esse limite. Em algumas regiões da
capital carioca, por exemplo, o barulho em condomínios não pode exceder
35 decibéis. No entanto, em alguns casos, os próprios condôminos devem
recorrer a lei de vizinhança para resolver o conflito. "Se o barulho
incomodar apenas uma pessoa, o condomínio não tem legitimidade para
intervir", afirma o advogado da ABADI.
Drogas e Cigarro: Uma
preocupação que tem esquentado a cabeça de muitos síndicos está ligada
ao consumo de entorpecentes dentro do condomínio. O porte de maconha
para consumo próprio, por exemplo, não é crime no país. No entanto, é
possível que esta prática gere inconvenientes para os outros moradores. A
reação, contudo, deve variar de acordo com o local em que o condômino
usa o entorpecente. "Se é dentro do imóvel, a atuação é muito limitada",
diz Borges. A polícia deve ser acionada apenas quando os efeitos
alucinógenos começam a incomodar ou colocar outros moradores em risco.
Quando o uso é em áreas comuns do prédio, a história é outra. "A
administração do prédio pode até enquadrar o condômino em uma conduta
anti-social", diz. No caso de cigarro, as regras variam de acordo com a
legislação antifumo de cada estado. Por exemplo, em São Paulo, a lei
proíbe que os condôminos fumem nas áreas comuns dos prédios. No Rio de
Janeiro, a proibição é mais rigorosa: os moradores não podem fumar nem
mesmo na varanda do apartamento.
Comércio: Com
expansão do mercado autônomo e de projetos de trabalho remoto,
tornou-se comum que profissionais de diversas áreas atendam clientes em
suas próprias residências. Apesar dos benefícios para os profissionais,
esta prática pode ser traduzida em riscos de segurança para os outros
moradores. "Se o condomínio é residencial, manter uma atividade
comercial no imóvel é irregular", diz Borges, da ABADI. Muitas vezes, no
entanto, é difícil comprovar estes casos. A solução para os casos mais
graves é restringir a entrada de desconhecidos, por exemplo.
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